A moratória da soja em Rondônia: entre avanços e retrocessos

Deputados querem legalizar a exportação de monoculturas provenientes de áreas desmatadas.
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Voz da Terra
28 junho 2024
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Exploração de soja no Brasil — Foto: CNA/Wanderson Araujo/Trilux

A moratória da soja no Brasil é vista como crucial para a preservação ambiental, mas enfrenta críticas por limitar o desenvolvimento econômico, gerando tensões entre sustentabilidade e crescimento no mercado internacional.

Por Francisco Costa - Voz da Terra

Nos últimos meses, a moratória da soja tem sido um tema quente em Rondônia. Essa política, que visa impedir o desmatamento ilegal para a produção de soja, é vista por alguns como um passo essencial na proteção ambiental, enquanto outros a consideram um entrave ao desenvolvimento econômico.

Para quem não sabe, a moratória da soja faz parte de um acordo nacional entre a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (ABIOVE) e a Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (ANEC) em 2006. O compromisso de ambos foi não comercializar soja retirada de áreas desmatadas na Amazônia Legal após 2008.

A moratória pode trazer benefícios claros. Se cumprida, ajuda no equilíbrio ambiental reduzindo o fogo nas florestas e o desmatamento. Isso é crucial para a preservação da biodiversidade e para o combate às mudanças climáticas, já que a as florestas desempenha um papel vital na regulação do clima global.

Além disso, a moratória pode ajudar a melhorar a imagem do agronegócio brasileiro no exterior. Grandes compradores internacionais de soja, como a União Europeia, exigem garantias de que os produtos não estejam ligados a grilagem de terras, derrubadas de áreas verdes e retirada de madeira de maneira ilegal. Manter essa política atrai investimentos e mantém o acesso a mercados importantes, o que é vital para a economia local e nacional.

Por outro lado, nem tudo são flores. Pequenos e médios produtores reclamam que a moratória prejudica a expansão de suas atividades. Argumentam que a burocracia e as restrições dificultam a competitividade, especialmente em relação a estados onde a moratória não é aplicada de forma tão rígida. Isso pode levar à migração de investimentos para outras regiões, afetando a economia local.

Além disso, existe um mercado negro em expansão. A pressão por terras agrícolas tem levado a um aumento das invasões e ocupações ilegais, muitas vezes encobertas por documentos falsificados, grilagem de terras para lavagem de dinheiro e corrupção. Isso resulta em intrínseca rede de poder que gera conflitos agrários e violência no campo, com indígenas e ribeirinhos e demais populações amazônicas que são as maiores vítimas.

Entre os 9 estados que formam a Amazônia Legal, Rondônia é o terceiro maior desmatador na série história do Inpe, que vai de 1988 a 2021. Ao todo, Rondônia já derrubou 64,6 mil km² de Floresta Amazônica. Desmatou 16.350,98 km² entre 2008 e 2023. 

População rondoniense tem enfrentado mudanças climáticas extremas nos últimos anos como seca severa, enchentes e inundações. Cidades ficaram cobertas com a fumaça das queimadas. E os pesquisadores e cientistas indicam que julho e agosto de 2024, deve ser de desertificação dos rios e situação crítica para as populações da floresta. 

Desmatamento e queimada próxima à Floresta Nacional Bom Futuro, em Porto Velho, Rondônia, em outubro de 2023. (Foto: © Marizilda Cruppe / Greenpeace)

Ação dos deputados estaduais

Nos bastidores, a bancada do agronegócio se movimenta para alterar o cenário. Propostas de lei devem surgir para flexibilizar a moratória. Os parlamentares alegam que as mudanças são necessárias para o desenvolvimento econômico do estado. No entanto, críticos apontam que essas iniciativas buscam legalizar o ilegal, regularizando áreas desmatadas recentemente e incentivando mais desmatamento. 

Os deputados estão usando brechas legais e pressionando órgãos ambientais para liberar licenças e autorizações de maneira mais rápida e menos criteriosa. Isso tem gerado um clima de insegurança jurídica e ambiental.

Em junho deste ano, o deputado Luís do Hospital (MDB), presidente da Comissão de Agropecuária e Políticas Rurais (CAPR) da Assembleia Legislativa de Rondônia (Alero), se colocou à frente da luta contra a moratória da soja e seus possíveis impactos no estado.

"Não podemos permitir que interesses externos prejudiquem o desenvolvimento do nosso estado. Estamos unidos para proteger o agronegócio rondoniense e garantir o futuro da nossa gente", declarou.

Na última terça-feira (25), os deputados estaduais Ismael Crispin (MDB), presidente da Comissão de Constituição e Justiça, e Luiz do Hospital estiveram reunidos com integrantes da diretoria da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Rondônia (Aprosoja-RO).

O presidente da CCJ, vai protocolar um projeto de Lei que "estabelece critérios para a concessão de incentivos fiscais e terrenos públicos para empresas do setor agroindustrial, com o objetivo de promover a livre iniciativa, o desenvolvimento dos municípios e a redução das desigualdades sociais e regionais".

Crispin argumentou que o objetivo do PL é assegurar que os incentivos fiscais e a concessão de terrenos públicos beneficiem apenas empresas que realmente contribuem para o desenvolvimento econômico, social e regional. Ele enfatiza que a proposta respeita os princípios constitucionais de livre iniciativa e busca prevenir que acordos externos prejudiquem a economia local.

O PL deveria tramitar nas comissões Assembleia Legislativa de Rondônia antes de ser submetido à votação em plenário. Os deputados estão mobilizando bancadas para aprovar com urgência a lei. Por enquanto, os parlamentares não comentaram sobre nenhuma audiência pública para debater o tema com a sociedade. Estão com pressa para avançar com a pauta, antes do período eleitoral de 2024.

A lei de Rondônia tem como base outra elaborada no Mato Grosso. Lá os deputados ouviram a população antes de avançar com aprovação da regulamentação. E dentro do Plano de Desenvolvimento criaram um "jabuti" liberando geral o comércio de soja. 


Bancada do agronegócio elabora lei para derrubar moratória da soja (Foto: Secom)

A soja

O plantio de soja tem causado significativos danos socioambientais. A expansão das áreas de cultivo está frequentemente associada ao desmatamento ilegal, especialmente na Amazônia e no Cerrado. 

Isso leva à perda de biodiversidade e à emissão de grandes quantidades de carbono, agravando as mudanças climáticas. 

Além disso, as comunidades locais, incluindo povos indígenas e ribeirinhos, enfrentam a expulsão de suas terras, conflitos por terras e a destruição de seus modos de vida tradicionais. 

A utilização intensiva de agrotóxicos contamina solo e água, afetando a saúde das populações vizinhas e prejudicando todo meio ambiente.

Efeitos

Porém é uma monocultura que fortalece a economia do Brasil, que é um dos maiores exportadores mundiais dessa commodity. Isso gera empregos e contribui para o desenvolvimento de infraestruturas locais. No entanto, os efeitos negativos são consideráveis. 

O desmatamento e a degradação ambiental comprometem ecossistemas inteiros, e as práticas agrícolas intensivas podem esgotar os recursos naturais, tornando o solo menos fértil ao longo do tempo. 

O uso excessivo de agrotóxicos representa um risco significativo para a saúde humana e ambiental. Assim, é necessário um equilíbrio cuidadoso entre os benefícios econômicos e a sustentabilidade socioambiental.

A moratória da soja em Rondônia é um exemplo clássico de uma política com duas faces. Enquanto promove a conservação ambiental e melhora a imagem do agronegócio brasileiro, também impõe desafios econômicos e incentiva práticas ilegais. 

A atuação dos deputados estaduais, tentando legalizar o ilegal, adiciona uma camada de complexidade a essa questão. No fim das contas, a solução deve equilibrar desenvolvimento econômico e preservação ambiental, um desafio que Rondônia precisa enfrentar com seriedade e transparência.




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