Ameaçado, povo Karipuna pede do governo proteção e vigilância do território

Durante a retirada dos invasores houve a destruição de uma ponte de acesso para a terra indígena. Foi uma alerta e ameaça, segundo lideranças.
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Voz da Terra
3 julho 20245 minutos de leitura
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Área Sul da TI Karipuna é a mais desmatada e cobiçada. Região usada para exploração de madeira e criação de gado. (Foto Survival)

Indígenas querem vigilância e a presença do governo brasileiro dentro do território. Lideranças alertam que os invasores vão reocupar a região e fazer novas ameaças. O governo diz que haverá monitoramento e políticas públicas para o povo. 

Francisco Costa - Voz da Terra 

A desintrusão do Território Indígena Karipuna em Rondônia trouxe alívio e medo. Durante todo o mês de junho, o governo brasileiro realizou uma grande operação com mais de 200 militares e servidores públicos de várias instituições da União no território. Essa operação é para retirada de invasores que estavam ocupando o território de maneira ilegal. A presença de tropas das forças de segurança resultou em ataques, segundo os indígenas.

O Voz da Terra recebeu vídeos, relatos por meio de áudio e documentos. Neles, lideranças acusam os invasores pela destruição de uma ponte improvisada, construída com troncos de madeira, que é o único caminho de acesso para entrar no território.

"O crime organizado continua atuando no território. Cortaram a ponte de acesso à aldeia Karipuna", fala um dos moradores em um vídeo compartilhado na internet, na frente da ponte destruída, apontando para os troncos que foram quebrados. O relato é de que a estrutura para passagens de veículos e pedestre foi parcialmente danificada no último dia 30 de junho. 

Ponte destruída (Foto: Povo Karipuna)

"Eu vejo que o governo não tem feito nada. Mesmo com a desintrusão, o crime está atuando dentro do território. Isso, tirando nosso acesso via terrestre. Esperamos que as autoridades tomem providências sérias sobre esse caso", diz o rapaz no vídeo.

Na segunda quinzena do mês passado, o cacique André Karipuna já tinha alertado da necessidade de uma base de operações do governo federal com estrutura de segurança no território. "O trabalho está saindo bem. Agora no momento nos sentimos mais seguros. Mas queremos que tenha uma base permanente, para realizar mais operações de proteção no território Karipuna. Provavelmente (os invasores) vão retornar", falou.

O grito dos indígenas não é só por mais segurança. Eles querem políticas públicas de saúde, educação, infraestrutura, segurança alimentar, assistência social e ações de sustentabilidade para sobrevivência.

"A gente sofre grandes ameaças. Essa (desintrusão) pode aumentar as ameaças depois e vemos isso com preocupação. Nos sentimos seguros, mas pensamos mais na frente porque podemos sofrer grande risco de novas ameaças", disse o Cacique.

"Estamos sofrendo ataques, retaliação por parte dos invasores. Os invasores cortaram a ponte para dificultar o acesso", alerta Adriano Karipuna, principal líder dos indígenas. 

A mesma ponte foi destruída pelos ilegais, há cinco anos durante a "Operação Ajuricaba V", criada para desarticular organizações criminosas instaladas na região, com ponto central de atuação no distrito de União Bandeirantes, município de Porto Velho, onde fica a terra Karipuna.

De acordo com Adriano, naquele ano "aconteceu a mesma situação. Mas a retaliação foi maior". Foi quando uma comitiva dos Karipuna esteve na Organização das Nações Unidas (ONU) e no Vaticano para denunciar que desde 2017 os invasores cometem crimes ambientais no território. "Na época destruíram o posto de vigilância".

"A nossa preocupação é pós-desintrusão. Precisamos de medida protetiva para os povos indígenas, fiscalização e vigilância contínua por parte do estado. A proteção territorial e a reativação do posto de vigilância na divisa, que fica no igarapé Fortaleza, no Distrito de União Bandeirantes", reclamou Adriano.

Os indígenas

No total, a região Karipuna possui 153 mil hectares, com a população indígena distribuída em duas comunidades. Devido ao histórico de extermínio, são povoados pequenos, compostos, em maior parte, por jovens que estabelecem relações de trabalho nos distritos e vilas de Porto Velho. Terra Indígena Karipuna (TIKA), é localizada nos municípios de Porto Velho e Nova Mamoré, em Rondônia (RO).

Uma área que enfrenta ameaças devido às atividades ilegais de madeireiros e garimpeiros, que exploram os recursos naturais, contaminam os rios, colocam em risco a saúde da população local e ameaçam a cultura e a organização social dos povos indígenas.

Dados da Plataforma Brasil Mais, indicam que em 2023 foram registrados 51 alertas de desmatamento na TI Karipuna. Em comparação com o ano de 2022, durante os últimos 12 meses do governo anterior, foram registrados 435 alertas de desmatamento no local, indicando uma redução de 88% neste ano.

A desintrusão

A desintrusão, que prevê a retirada de invasores – em especial garimpeiros e madeireiros ilegais – do território Karipuna, é essencial para a preservação da organização social, costumes, língua, crenças e tradições dos indígenas. A etnia Karipuna, que hoje conta com reduzido número de membros, corre risco de extermínio.

A operação, que se estenderá até o final de julho, também busca combater crimes na região, erradicar o trabalho análogo à escravidão e promover a sustentabilidade ambiental. Além disso, após a desintrusão, serão implementadas medidas para impedir o retorno dos invasores, segundo a União. 

Ações integradas e monitoramento

A desintrusão na TI Karipuna conta com um robusto aparato tecnológico, incluindo aplicativos de navegação georreferenciada, drones, antenas e um dashboard para monitoramento das ações. Essa estrutura garante a eficiência e a precisão da operação. 

O processo ocorre em cumprimento a determinações do Supremo Tribunal Federal (STF) e da Justiça Federal, para assegurar a proteção territorial indígena e a preservação do meio ambiente.

Por meio da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 709, o Supremo Tribunal Federal (STF) ordenou, em novembro de 2023, que a União preparasse, em um prazo de 90 dias, planos para a retirada de invasores nas terras Yanomami, Karipuna, Araribóia, Kayapó, Uru-Eu-Wau-Wau, Trincheira Bacajá e Mundurucu, que seguem cronogramas distintos de desintrusão. 

Em de março deste ano, foi homologado, pela Corte, os planos operacionais, incluindo o Plano de Monitoramento e Desenvolvimento Continuado (MDC), destacando a necessidade de que os processos de retirada em cada território sigam planejamentos semelhantes e adaptados à realidade de cada comunidade.

O governo federal diz que após a desintrusão, haverá o monitoramento da região e elaboração de um plano de sustentabilidade do território, feito em parceria com Ministério dos Povos Indígenas (MPI) e o Ministério da Defesa (MD), sob a coordenação da Secretaria-Geral da Presidência da República (SG/PR).

Base militar de operações na TI Karipuna para a desintrusão (Foto: Governo federal)

 
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